Vida de revisor é difícil 30

Mestre, existe isso? “A verdade é que, no primeiro momento, eu me simpatizei com o senhor.” Está certo “me simpatizei”?

Existir existe!... Mas é coisa de quem não sabe se expressar. Esse verbo só é pronominal quando tem noção recíproca: “Eles se simpatizaram.” Um simpatizou com o outro. No seu uso normal e mais constante, ele não pode vir acompanhado do pronome oblíquo e tem um objeto indireto com a preposição “com”: “A criança simpatizou com a professora.”


Vida de revisor é difícil 29

Professor, este “lhe” está bem usado? “Não é a primeira vez que um presidente deseja usar a Polícia Federal para lhe abastecer de informações.”

Está mal usado. O verbo “abastecer”, nesse caso, tem dois complementos: um objeto direto e outro indireto, que é introduzido pela preposição “de”. Vê-se que o “lhe” seria usado como objeto direto, o que não é possível, já que, para substituir objetos diretos, o pronome de 3ª pessoa deve ser “o, a, os e as” – o “lhe” serve para evitar a função de objetos indireto. Assim, a frase tinha de ser escrita da seguinte forma: “Não é a primeira vez que um presidente deseja usar a Polícia Federal para abastecê-lo de informações.”  


Vida de revisor é difícil 28

Este uso de “meia noite” é correto? “As pessoas começaram a dizer que os doentes recebiam de noite um ‘chá da meia noite’”.

Não. Não está correto. Se “meia noite” é um numeral seguido do substantivo, não existe o hífen e significa “metade da noite”, algo claramente subjetivo. Se a pessoa costuma dormir às 22h e acorda às 6h, o meio da noite é 2h, plena madrugada. No entanto, caso o texto se refira ao último momento do dia e primeiro minuto do dia seguinte, aquele horário que pode ser resumido como “zero hora”, o certo é escrever “meia-noite”.

Então, provavelmente, na frase acima, a crença popular sobre a importante Santa Casa da Misericórdia, em 1918, aludindo ao fato de que muitas pessoas saíam de lá direto para o cemitério, deveria ser escrita assim: “As pessoas começaram a dizer que os doentes recebiam de noite um ‘chá da meia-noite’”.  


Vida de revisor é difícil 27

Professor, pode um grande jornalista colocar o pronome átono desta forma: “Ninguém se incomodou porque sabia-se que era verdade”? E o revisor, pode deixar passar?

É uma posição complicada. Não é fácil fazer revisão de um texto escrito por um grande jornalista. Muitas vezes, são colocações pronominais erradas, mas que passam a imagem de que é essa a forma correta. Em outras palavras, parece que esse é o uso formal, o padrão culto da língua portuguesa. Aí coitado do revisor: Vai dizer que o “chefão” errou?

No caso, temos um “porque” conjunção causal; assim, um conectivo, situação em que ele atrai o pronome pessoal para a próclise, colocação antes da forma verbal de que depende.

Como a próclise, nos casos em que ela não é obrigatória, é uma preferência brasileira, diferentemente da fala portuguesa, que opta pela ênclise, muita gente pensa que seria esse caso.

No entanto, não é! O certo, nesse caso, é “Ninguém se incomodou porque se sabia que era verdade.”


Vida de revisor é difícil 26

Um aluno pergunta: No texto:

“Há, na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, um projeto de lei que proíbe a execução de reparos não-emergenciais em condomínios do estado enquanto durar a pandemia.”

Há algum erro?

As vírgulas estão corretamente usadas, uma vez que separam o termo que interrompe a linha normal da estrutura lógica: “Há... um projeto de lei...”.

Existe, no entanto, um erro: a grafia de “não-emergenciais”.

A composição de palavras com o “não”, fazendo o papel de um prefixo, era muito confusa, pois tinha diferença quando a palavra seguinte era um substantivo ou um adjetivo.

Desde o último Acordo ortográfico, porém, foi resolvida com clareza: não pode ter o hífen! Escreve-se “não emergenciais”!